ARTIGO: Os fatos e a norma

Alexandre Antonio Vieira Vale*

A ignorância não é boa conselheira e a manipulação de fatos jamais permitirá a formação de juízo pertinente sobre aspectos da realidade que se deseja analisar em profundidade. Outro fator que compromete o raciocínio é a subsunção de temas complexos a dualismo elementar ou a maniqueísmo rasteiro, o que em nada contribui para o aprimoramento das questões que se quer escrutinar.

Volto ao tema que envolve a Instrução Normativa emitida pelo TCE que disciplinou a realização de festividades com o emprego de recursos públicos, pois tenho percebido a difusão de algumas informações que precisam ser melhor contextualizadas e clarificadas.

Ressalto, de forma cristalina e indispensável, a necessidade de que toda a sociedade avalie, conteste, critique, debata, enfim, acompanhe com propriedade e rigor a atuação de todas as instituições e agentes públicos. Não há caminho melhor, no sistema democrático e republicano, para se encontrar as soluções que nos conduzirão à construção de um país com justiça social.

Mas todo debate deve ter um objetivo e ocorrer dentro de parâmetros lógicos que não comprometam a sua finalidade. Não estou percebendo isso quando se trata da Instrução Normativa 54 do Tribunal de Contas do Estado (TCE).

A ação do TCE de emitir norma disciplinando a realização de festividades não ocorreu de forma arbitrária, discricionária e muito menos casuística. Resultou de processo amplo, transparente e interinstitucional, ancorado na legislação vigente que sustenta a atuação específica do órgão como ente responsável pelo exercício do controle externo.

Dentro de suas esferas de atuação e responsabilidades institucionais, o Ministério Público Estadual (MPE) e o Ministério Público de Contas (MPC) ingressaram com Representação junto ao TCE, pleiteando a edição de norma com o objetivo de disciplinar a realização de festividades com o emprego de recursos públicos.

Na Representação, apresentaram suas percepções sobre o tema, sempre norteadas pelo ordenamento jurídico vigente e tendo com parâmetro principal a Constituição Federal. O TCE recebeu a Representação e instaurou processo, dando a ele um Relator. Destaque-se que todos esses procedimentos são públicos, inclusive o integral trâmite da Representação, podendo ser acompanhados no site do TCE na internet: www.tce.ma.gov.br.

Em Sessão Plenária, igualmente pública e acessível a todo cidadão, transmitida ao vivo pela internet no mencionado site, o TCE debateu a Representação conjunta do MPE e do MPC. Poderia rejeitá-la ou acolhê-la. Em razão da pertinência, da relevância da Representação no contexto da gestão pública e da solidez de seus fundamentos jurídicos, decidiu o TCE emitir a Instrução Normativa 54.

Olhar atento a todo esses procedimentos; públicos, transparentes e legítimos, fundamentados em normas constitucionais límpidas; não pode resultar nas conclusões equivocadas que atribuem arbitrariedade, discricionariedade, oportunismo ou intromissão em campo indevido por parte do TCE, do MPE ou do MPC.

A Instrução Normativa 54 é legítima. A defesa que a IN faz das prioridades gerenciais encontra ressonância em todos os cidadãos que desejam que as administrações públicas em nosso país se harmonizem com os legítimos interesses públicos, atuando prioritariamente e com efetividade em áreas como educação, infraestrutura, saúde e segurança pública, entre outras, sem com isso descuidar das autênticas manifestações que expressam a riqueza do patrimônio simbólico de nosso povo, como o Carnaval. Trata-se apenas de estabelecer o que, em determinado momento e sob condições peculiares, deve ser prioritário. E isso nossos gestores públicos precisam fazer. Sobretudo em tempos de recursos financeiros exíguos.

Óbvio que a Instrução Normativa 54 não se pretende redentora. Salta aos olhos que as questões que envolvem a gestão pública em nosso país são complexas, de elevada gravidade e precisam ser enfrentadas com rigor, resolutividade e urgência em benefício dos cidadãos honestos, éticos, compromissados e trabalhadores, que diariamente constroem a imensa riqueza material e simbólica de nosso país. O que muitos nos orgulha, não obstante as mazelas que nossa realidade apresenta e que precisamos suplantar.

Evidente. Por demais irrefutável, que instituições como o TCE, o MPE e o MPC, a exemplo de várias outras instituições republicanas, possuem contradições que devem ser enfrentadas e exterminadas por seus integrantes e pela sociedade, dentro dos princípios democráticos e da legalidade, como os injustificáveis e repugnantes privilégios que não se coadunam com a nobre missão dessas instituições e que são objeto de total, integral e legítimo repúdio de amplos setores da sociedade.

Sejamos, como instituições e sociedade, capazes de combatê-los. De extirpá-los em prol do fortalecimento da legitimidade e do respeito social que todas as instituições devem possuir na República.

Não há instituições perfeitas. Da mesma forma que nenhuma instituição é a expressão de todas as coisas nefastas de uma sociedade. Se desejamos, como cidadãos e sociedade, aprimorá-las, que nos envolvamos e participemos ativamente desse processo. Há aspectos positivos e negativos em suas atuações. E, no caso da Instrução Normativa 54, o TCE atuou dentro da legalidade e na defesa dos legítimos interesses públicos.

* Alexandre Antonio Vieira Vale, auditor estadual de controle externo do Tribunal de Contas do Estado do Maranhão. Especialista em Administração Pública. Mestrando em Administração Pública.

2 pensou em “ARTIGO: Os fatos e a norma

  1. Só quem vê qualquer irregularidade na Instrução Normativa do TCE é quem tem convivência e/ou conivência com a imoralidade no uso dos recursos públicos.

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