“É de causar estupefação!”, diz doutor em Direito de decreto que autoriza Estado a descumprir decisões judiciais

Decisão judicial é pra ser cumprida!

Christian Barros Pinto*

Publicado em 03/12/2018, o Decreto n° 34.593/2018 dispõe que “A implantação de qualquer vantagem oriunda de decisão judicial será cumprida mediante existência de dotação orçamentária” e determina que qualquer órgão do Estado, uma vez intimado a cumprir decisão judicial, deverá “encaminhar previamente a qualquer outro ato, a citada intimação para consulta à Seplan”.

É de causar estupefação!

Aprendi, já no início do curso de Direito, que os Poderes da República são independentes. Isso está na Constituição Federal, texto base de nosso país (perdoe o truísmo), mas que é rotineiramente esquecido, talvez porque já se foram trinta anos de sua promulgação, talvez porque seja conveniente agir como ignorante e tentar fazer valer interesses ilegítimos em prejuízo da sociedade.

E do valioso senso comum também sei que decisão judicial precisa ser obedecida, porque, se assim não o for, de nada serve a Constituição, os juízes e o Judiciário inteiro.

Pois só isso basta para notar o tamanho desatino de um decreto que submete as decisões judiciais à prévia deliberação de órgão do Estado, querendo dizer que talvez as ordens não sejam cumpridas – e muito provavelmente não serão.

O decreto situa o Poder Executivo numa posição elevada e diminui o Judiciário a um Poder sem poder algum, já que o torna incapaz de impor suas decisões e de cumprir o seu papel constitucional.

Além disso, o decreto ofende a sociedade maranhense, porque, bem ou mal, o governante é eleito para cuidar dos interesses do povo. Nesse caso, entretanto, o poder do povo foi exercido contra o povo, ainda que se diga que a medida tenta preservar o direito da maioria da população.

Que não se perca de vista que as vantagens que o decreto se furta a implantar são aquelas que o Estado subtraiu dos seus servidores e que, por recalcitrância e perversidade, só foram reconhecidas em longos e penosos processos judiciais. E são essas vantagens que o Estado vem tentando (o gerúndio é proposital) retirar, mediante os mais estranhos e incabíveis expedientes processuais em trâmite no Tribunal de Justiça.

Mas, para que estas ponderações não pareçam apenas lamúrias, basta ver que o decreto é absurdo por seus próprios fundamentos ou, melhor dizendo, pelos demais fundamentos da LC 101/2000, que foram esquecidos, em uma ousada tentativa do uso da popular técnica João-sem-braço.

É que o decreto invocou o artigo 21 da LC, mas se fez desentendido diante do artigo 22, que excepciona a vedação de aumento de despesas com pessoal quando a vantagem derivar de sentença judicial.

No mais, nem é preciso ir longe, pois o STJ já assentou que “os limites orçamentários previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, no que se refere às despesas com pessoal do ente público, não podem servir de fundamento para o não cumprimento de direitos subjetivos do servidor, sobretudo na hipótese de despesas provenientes de decisão judicial.” (AgInt no AREsp 1186584/DF).

O decreto desrespeita o Judiciário e insulta os cidadãos, pois crê que ninguém perceberá que não existe um tal fundamento legal para o descumprimento de decisões judiciais.

Talvez sua edição tenha sido feita na suposição de que o ato não será impugnado ou que o Judiciário passará por cima de jurisprudência consolidada, apenas para satisfazer os interesses do Governo.

Tempos estranhos estes em que o Executivo decreta a violação da Constituição e quer colocar o Judiciário e a sociedade de castigo, no canto da sala, com a cabeça virada para a parede.

* Doutor em Direito, advogado e sócio de Barros & Cheskis Advocacia e Consultoria Jurídica, professor universitário

12 pensou em ““É de causar estupefação!”, diz doutor em Direito de decreto que autoriza Estado a descumprir decisões judiciais

  1. Sábias palavras. Uma grande lição. Infelizmente é o comunismo ditatorial vencendo o bom senso. Interessante, a mesma lei que originou o decreto ditatorial garante o direito do servidor. Agora a pergunta é: o Ministério Público vai se manifestar? Alguém se lembra a última vez que o MPE encarou Flávio Dino?

  2. Não esperem racionalidade de FLávio Dino, ele faz tudo que for necessário para alcançar seus objetivos. È um governador desastroso, incompetente, perseguidor e fanático pela ideologia esquerdista, mas se crê destinado a presidir o Brasil !
    È um caso clássico de sociopata.

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  4. Tenho mais que certeza que os nossos desembargadores jamais irão desprestígiar os juízes que agem de forma correta e ilibada, sinceramente não acredito , então OAB neles. o

  5. Tenho mais que certeza que os nossos desembargadores jamais irão desprestígiar os juízes que agem de forma correta e ilibada, sinceramente não acredito , então OAB neles.

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