Prof. Dr. da Ufma fala sobre Dia Nacional dos Cuidados Paliativos

Professor Doutor João Batista S. Garcia. Médico paliativista e especialista em dor, com área de atuação reconhecida pela Associação Médica Brasileira.  
10 de outubro. Dia Nacional dos Cuidados Paliativos no Brasil. Alguma estranheza? Creio que sim. Vivemos em um país onde pouco se sabe sobre o assunto, desde o público até os profissionais de saúde de maneira geral.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, cuidados paliativos consistem em uma abordagem que promove qualidade de vida de pacientes e seus familiares diante de doenças que ameaçam a continuidade da vida, através da prevenção e alívio do sofrimento. Requer a identificação precoce, avaliação e tratamento impecável de problemas físicos, psicossociais e espirituais. Fica bem claro que não apenas o paciente, mas também a sua família devem ser o foco da atenção. Os sintomas físicos como a dor, a falta de ar, a náusea, os vômitos, a anorexia e a fadiga, por exemplo, não são os únicos a serem tratados. Há uma extrema preocupação com o bem-estar psíquico, com o controle da ansiedade, tristeza, insônia, depressão e distresse, além da busca de um equilíbrio e suporte social, que muitas vezes está comprometido pela doença. Ainda, a espiritualidade é vista como uma necessidade que pode gerar sentido para a vida e consiste em mais uma dimensão da saúde. Diante de todos estes aspectos citados, é coerente pensar que um profissional sozinho não poderia responder por tantas demandas e que uma equipe multiprofissional e interdisciplinar seria o meio mais apropriado para conseguir promover o cuidado. E é isso que acontece nos serviços onde este tipo de atendimento está estabelecido, existe uma equipe especializada, preparada e dirigida para garantir a proporcionalidade e adequação terapêutica nas diversas fases do adoecimento.

Que pacientes são elegíveis para este tipo de atendimento? Talvez esta seja uma pergunta comum. Imagina-se que cuidado paliativo seja apenas dirigido para pacientes que estejam na fase final da vida, em processo de morte e que tenham câncer. Na verdade, esta é uma intervenção que pode se antecipar aos sintomas que sabidamente podem gerar o sofrimento humano em uma fase mais avançada da doença, seja ela de qualquer natureza, uma doença de Alzheimer ou um câncer metastático e potencialmente letal. Portanto, o atendimento deve ser o mais precoce possível, facilitando o entrosamento do paciente e seus familiares com a equipe que estará presente até os últimos dias de vida.

Apesar de todos estes conceitos racionais e harmoniosos, os cuidados paliativos foram há apenas três anos reconhecidos pela Associação Médica Brasileira como uma área de atuação, que então certificou pouco mais de quarenta médicos em todo o território nacional. Na maioria dos currículos das faculdades de medicina, o cuidado paliativo não se encontra como disciplina obrigatória ou mesmo optativa. A Universidade Federal do Maranhão, constitui uma exceção, pois incorporou recentemente os cuidados paliativos em sua grade do curso de medicina, de forma progressiva e obrigatória. Para os demais profissionais envolvidos, a realidade é pior. Enfermeiros, psicólogos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, nutricionistas, assistentes sociais entre outros, devem buscar qualificação na pós-graduação em poucos cursos oferecidos, geralmente fora de suas cidades. Quanto à população, esta não tem o devido esclarecimento, apesar de um crescente interesse pelo assunto dos meios de comunicação. Em nossa cidade, este tema é pouco debatido e há muitos tabus e crenças inadequadas, constituindo uma realidade não muito diferente da observada em outras áreas do país.

No Estado do Maranhão há serviços em formação, como no Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão, que criou uma comissão para orientar a condução de seus pacientes internados, especialmente aqueles com doenças neurodegenerativas e crônicas não oncológicas. Há estruturas mais complexas nos dois hospitais que tratam do câncer, onde o cuidado paliativo inevitavelmente sobressai-se. O Hospital Aldenora Belo destaca-se pelo atendimento ambulatorial e domiciliar há vários anos. No Hospital de Câncer do Maranhão, instituição estadual, foi criada a primeira enfermaria para pacientes em cuidados paliativos, que completou um ano de pleno funcionamento no mês passado. Este setor dispõe de dez leitos e de uma equipe nos moldes acima descritos.

Conclui-se que há um esforço local de melhorar o atendimento e de contemplar cada vez mais pessoas em nossa região. Entretanto, o Brasil ainda precisa traçar políticas públicas dirigidas aos cuidados paliativos, que visem qualificação e educação contínua de profissionais, disponibilidade de locais de atendimento e de medicamentos, bem como suporte financeiro específico para as instituições que lidem com tais cuidados. É imperioso legitimar que os cuidados paliativos configuram uma necessidade básica de saúde.