José Sarney: “disseram-me que o mês foi triste”

O São João do Maranhão

Coluna do Sarney

O São João do Maranhão teve várias marcas. A primeira, da forma tradicional vinda dos Açores, com grande marca portuguesa. Até o boi eles tinham na ilhas de onde vieram os primeiros emigrantes para o Maranhão. Lá era mais um boi pequeno, muito assemelhado ao chamado boi de mamão, como sobrevive até hoje em Santa Catarina.

Mas as festas juninas portuguesas eram mais marcadas pelas danças de roda e pelas quadrilhas. Carlos Lima foi quem melhor estudou o nosso boi, que foi boi-bumbá e definitivamente ficou como BUMBA MEU BOI. O São João de outrora girava, em quase todas as casas, em torno da fogueira, com as danças de sempre. Com as mãos cruzadas em cima se jurava amizade, no ritual do compadrio.

IMG_1007.JPGDepois – coisa dos últimos 30 anos – agregaram-se as festas reunindo São João, São Pedro e São Marçal. São João, discípulo amado de Jesus, que repousava sua cabeça no peito do Mestre; São Pedro, o chefe da Igreja; e para São Marçal procura-se encontrar explicação de porque ressuscitou sua devoção em São Luís. Sua biografia é de poucos dados, com a lenda de que segurou a toalha com que Cristo enxugou os pés dos apóstolos na última ceia. Tornou-se santo pela voz do povo, no século VI. O certo é que as festas de junho terminam com seu dia, 30, que hoje é feriado municipal. Mudou-se o nome da antiga avenida do João Paulo para São Marçal, por lei seu dia é o Dia Nacional dos Brincantes de Boi, e ele é padroeiro dos bombeiros. Sobre São Marçal criaram-se várias histórias: que foi discípulo de Jesus, que assistiu à ressurreição de Lázaro… Chegaram a pedir ao papa Pio IX que o declarasse apóstolo, mas ele se negou a aceder ao pedido.

No Maranhão, dizem que a devoção – ou ressurreição, porque está esquecido no mundo inteiro, tendo sido retirado dos calendários cristãos e só sendo festejado aqui entre nós – foi introduzida por um senhor chamado José Pacífico de Moraes, por apelido Bicas, que, vendo no Anil dois bois de matraca, mandou-os dançar no João Paulo e iniciou o costume de ali reunir todos os anos os bois, porque não era permitido pela polícia Bumba-Boi entrar na cidade, para não causar desordem. Os bois eram tidos como brincadeira de caboclo e a cidade, preconceituosa, não os deixava descer.

Sabem quem acabou com essa ordem? Fui eu, em 66, governador do Estado que adorava os bois e os acompanhara na mocidade, quem mandei que brincassem na cidade inteira. Para começar, trouxe o primeiro para dançar no Palácio do Leões. Roseana herdou esse gosto pelo Bumba Meu Boi e pelos folguedos populares.

Este foi um dos poucos São João que não passei em São Luís. Disseram-me que o mês foi triste. O povo gostaria de acompanhar o boi, mas está com medo de sair de casa diante de tanta violência: só no último fim de semana 9 homicídios, no mês passado 89 mortes violentas, e no interior as quadrilhas estão explodindo caixas eletrônicos e assaltando bancos e casas.

Valei-nos São João, São Pedro, São Marçal e também dois santos de junho que são muito invocados pelo povo, Santo Antônio, o casamenteiro, o pregador, de Pádua e de Lisboa, e São Paulo, festejado junto com São Pedro desde o princípio da Igreja, motivo porque figurava na cerimônia de compadre dos velhos tempos.

Nota de pé de página: agora ocorreu-me que São Marçal talvez esteja incluído como bombeiro para apagar os excessos dos fogos de São João, fogueiras, busca-pés, foguetes e agora a pólvora dos revólveres, das pistolas e das espingardas que estão dominando a cidade.

“Maranhão perdeu sua influência na República”, assevera Sarney

O Feijão e o Sonho

Da Coluna do Sarney

Orígenes Lessa, um grande escritor brasileiro – que comigo e Bandeira Tribuzi, numa manhã ensolarada dos anos 50 do século passado, visitando São Luís, percorreu as nossas ruas parando diante dos sobradões de azulejos, extasiado com a beleza de nossas ladeiras e telhados -, escreveu um livro, O Feijão e o Sonho, cujo tema central é o conflito entre a dura realidade e a ilusão. Entre a vontade de ganhar dinheiro e ser rico e seus ideais e versos (Campos Lara, o personagem).

Não sabia eu que o destino me reservaria a felicidade de ser colega e grande amigo de Orígenes na Academia Brasileira de Letras, tendo nele votado para seu ingresso e, como presidente da República, o homenageei, indo a Lençóis Paulistas, sua terra, para inaugurar a biblioteca da cidade, que tinha o seu nome.

Lembro-me desse tema para, tentando uma comparação política, ver a demagogia, que é a promessa de solução fácil para problemas insolúveis, uma armadilha para enganar o povo, vendendo uma ilusão e promessas que já se sabe que não vão ser cumpridas.

Compare-se o que se promete e o que se cumpre. Então chega o feijão e o sonho vai embora.

bacabeiraComo exemplo, é com amargura que vejo que o sonho da Refinaria Premium do Maranhão, a que seria a maior do país, escorrer pelos dedos com a decisão da Petrobras de eliminá-la dos projetos nacionais. Isso revolta, mas o que mais revolta é ver a acomodação, a amnésia com que estamos aceitando essa decisão. O pior é que o Estado está tornando irreversível essa decisão negociando o terreno, dando o assunto como encerrado. Fico indignado e acho que todos devemos protestar, gritar, lutar e não se conformar de que a Refinaria esteja morta. Ela trará empregos e elevará o status econômico do Estado, gerando impostos, riquezas para ajudar os mais necessitados.

Se não tem dinheiro, por que não aceitar capitais particulares, nacionais ou estrangeiros, como a Petrobras já faz com a Petroquímica? É que o Maranhão perdeu sua influência na República.

Já fecharam a fábrica de alumínio da Alcoa, a guseria de Rosário, as guserias de Açailândia. Repito, vamos aceitar o retrocesso e a decadência? É andar para trás, é a recessão, é voltar à caveira de burro. Temos que lutar e não vamos nos conformar.

Eu fico com o sonho que se transformará em realidade. Não vamos desistir do Maranhão e ficar como estátua de sal, jogando pedra no passado como se isso fosse solução.

Vamos reunir pedras para construir e não para jogá-las como bolas de fogo do ressentimento e do ódio.

Para Sarney, “o Maranhão engatou marcha a ré”

Da Coluna do Sarney

Vejo um pessimismo que nunca me tinha ocorrido sobre o Maranhão. A Alcoa está encerrando a produção de alumínio da Alumar, uma das maiores fábricas do produto no mundo. São 740 mil toneladas métricas anuais de alumínio que está deixando de produzir, e para isso já demitiu cerca de mil trabalhadores altamente qualificados. Também fechou seu centro de treinamento, com tradição de excelência, e que recebia operários do exterior. Embora ainda continue produzindo alumina, ela anuncia que está avaliando a produção de 2,8 milhões de toneladas métricas de alumina, “com vistas a possíveis reduções, fechamento ou vendas”.

Inaugurada há mais de 30 anos, ela representava uma parcela considerável da capacidade industrial do Maranhão, e seu fechamento tem consequências que se estendem a toda a sociedade maranhense, pois esses empregos se multiplicavam em postos indiretos, e atingem a economia e o PIB do Estado.

A Margusa (Maranhão Gusa), que atuava em Bacabeira há 17 anos, produzindo 240 mil toneladas por mês, demitiu 500 trabalhadores; fecharam a Cosima (Companhia Siderúrgica do Maranhão), em Pindaré-Mirim, e a Fergumar (Ferro Gusa do Maranhão), em Açailândia; e a Gusa Nordeste – do grupo Ferroeste, que estava implantando uma aciaria no município – demitirá em abril e maio mais 300 trabalhadores. As guserias trabalham hoje com 30% de sua capacidade de produção, e em fevereiro perderam 4 milhões de dólares de receita.

Enquanto isso, as vendas no comércio baixaram 10% e o emprego global vai caindo, juntamente com o poder de compra, numa espiral descendente.

O Maranhão vai ficando para trás. Perdemos lugares importantes na administração federal: o Ministério de Minas e Energia, o Ministério do Turismo, a Embratur.

Em 1965, tínhamos um ginásio oficial, o Liceu Maranhense, onde eu estudei. Duas escolas superiores, Direito, Odontologia e Farmácia, estas uma só. O porto recebia um navio por semana e assim mesmo, algumas vezes nenhum. A estrada de ferro São Luís-Teresina estava sucateada e sem carga, incluída para ser arrancada como ramal deficitário. Nenhum quilômetro de asfalto. Usina a lenha, a Ullen, com quatro motores velhos. Nenhuma autoridade federal maranhense.

E o Maranhão cresceu. Transformou-se no estado de maior atração de investimento, com o 2º porto do Brasil, o Itaqui, e fábricas da Vale, da Alcoa, maior produtor de gás do Brasil, siderúrgica de Açailândia, estradas para todo lado, ligação São Luís-Teresina, Açailândia-Santa Luzia, São Luís-Alto Parnaíba, duas universidades, e dinamismo mercantil e industrial. Em 2014, quando Roseana deixou o governo o Maranhão era o 16º estado do país. Nenhum estado brasileiro cresceu tanto.

Agora, fecham essas empresas, demite-se mais de 4.000 empregos: o Maranhão, que era o estado do Nordeste que mais gerava emprego, parou e demite. As grandes obras são: fechar a Fundação da Memória Republicana e retirar o nome de Médici de uma escola.

O Maranhão parou e engatou marcha ré. Peçamos a Deus nesta Páscoa – nós que acreditamos Nele: tende piedade de nós.

“Nunca perseguimos ou excluímos ninguém”, reclama José Sarney

A infraestrutura logística

Da  Coluna do Sarney

Astolfo Serra escreveu que o mapa do Maranhão era colorido: “As terras, de ouro; as águas de nossos rios, de diamantes”. Essa visão dos intelectuais, cheios de amor pelo Maranhão, construída com paixão pela cultura, lhe deu projeção e glória. Porém, o outro lado da medalha estampava a amarga realidade do atraso. Foi para acabar com isso que a nossa geração sonhou e juntou a cultura ao desenvolvimento, binômio que iria fazer do Maranhão um dos estados brasileiros de maior futuro.

Como ponto de partida, tratamos da desintegração do Maranhão como estado e da fragilidade de suas bases econômicas. Para integrar o estado, tínhamos que traçar os eixos rodoviários para implantar moderna infraestrutura de transportes.

Logo ficou evidente a necessidade da implantação de um sistema rodoviário vocacionado a fortalecer a capital como cabeça econômica do estado. A Estrada São Luís-Teresina, uma vez asfaltada, seria a espinha dorsal desse sistema. A partir dela, em Peritoró, abriríamos novas estradas em demanda do sertão, integrando São Luís às vastas terras dos altiplanos de Santo Antônio de Balsas e Carolina. Esse eixo rodoviário, a partir de Presidente Dutra, tomava o rumo do Oeste, permitindo a ligação com as cidades de Tuntum, Barra do Corda, Grajaú e Porto Franco. Restava pensar na ligação com a Belém-Brasília. Isso exigia a travessia da floresta situada entre Santa Luzia e a Região Tocantina. Por igual motivo, projetamos a integração da Baixada à BR-135, com uma rodovia que, partindo de Miranda, atingisse a região do Turi e servindo os municípios de Arari, Vitória, Viana, Matinha, São Bento, Pinheiro e Santa Helena. Santa Inês, que ainda era distrito de Pindaré-Mirim, por mim transformado em município, seria também incorporado a esse sistema. O Maranhão não conhecia asfalto e precisava entrar nessa era com urgência.

Na Baixada maranhense, ainda predominavam, como meios de transporte, os teco-tecos, pilotados pelos comandantes Gaudêncio e Diegues, pioneiros da aviação na Amazônia, que pousavam em campinhos de futebol. No verão, as ligações entre os núcleos urbanos eram feitas a cavalo e em carro de boi; no inverno, usavam-se bois, cavalos e canoas.

Estávamos na segunda metade do século XX e a Baixada desconhecia as estradas. Decidimos instalar um Distrito em Pinheiro, com a finalidade de construir rodovias para ligar os municípios daquela região entre si, e, através de ferry-boats, a São Luís.

Em 1960, candidato à Presidência da República, Jânio Quadros veio a São Luís e, no Largo do Carmo, em discurso escrito por mim, afirmou: “Vamos fazer o Porto do Itaqui, construir as BRs 22 e 21, para ligar, respectivamente, São Luís a Teresina e o Pará ao Maranhão; implantar o Plano de Colonização da Sudene, a fim de proporcionar fi-nanciamentos e preços mínimos ao arroz maranhense, promover a expansão creditícia, apoiar a luta de emancipação dos lavradores e estimular a vinda de navios ao Maranhão, para escoar os produtos derivados do babaçu, que não têm como sair do Estado, sem esquecer os ferry-boats”. Eram pontos que havíamos identificado como importantes para desencadear o processo de desenvolvimento do Maranhão, os quais, mais tarde, foram detalhados e executados.

Além da infraestrutura logística, tornamos o planejamento mais abrangente nas áreas de saúde, educação, comunicação, energia e agricultura. Em cada uma destas áreas, fizemos grandes transformações, que lançaram o Maranhão numa nova era. O povo, que era descrente e pessimista, criou alma nova, com fé e confiança no futuro, consciente de que o sonho do desenvolvimento poderia ser realidade.

Isso foi o que fizemos, sem ataques ou vendetas pessoais ou partidárias. Nunca perseguimos ou excluímos ninguém. Nossa preocupação foi trabalhar pelo estado, pela realização do sonho de minha geração, abrindo portas para os que viessem a seguir.

Conhecíamos e estudáramos nossa História, mas não trabalhamos olhando para trás: nela entramos pela porta da frente.

Uma mudança de mentalidade

Da Coluna do Sarney

Fui conduzido à política por uma causa bem precisa; o desejo de compreender a economia e saber como ajudar o Maranhão a romper a estagnação. Para isso, sentia-me preparado intelectualmente e o tema, sendo recorrente, estava no centro das preocupações da minha geração. Não me moviam a busca e o dessejo do poder, pois, aos 20 anos, ninguém tem o dom de adivinhar o futuro. Mas a vida conduziu-me a conviver com ele e a exercê-lo, o que fiz sempre em benefício da causa pública.

sarney1Quando assumi o poder, não me deixei seduzir pelas facilidades que ele oferece aos oportunistas e carreiristas. Minha preocupação foi abrir o espaço que deveria ser ocupado pelo Maranhão e conquistar o respeito da opinião pública e o destaque na política nacional, onde sempre achei que seria mais útil para defender os interesses do meu estado.

A primeira coisa que o nosso grupo de jovens intelectuais pensou foi fazer um diagnóstico do Maranhão, para saber por que São Luís parara no tempo e, em 1950, continuava com a mesma área urbana de 50 anos antes, sem nenhum crescimento, conservando os obsoletos e sucateados serviços de transporte, água e energia, construídos no início do século. O sistema de governo era o mesmo: oligárquico, ou seja, aquele que a Revolução de 30 tentara acabar. A oligarquia, como pensavam os revolucionários, era o sistema baseado no coronelismo e mantido com os instrumentos de mando baseados unicamente na subjugação da coletividade pelo coletor, na extorsão dos impostos, e pelo delegado, no exercício da violência policial contra os cidadãos, com todo o conjunto de ações típicas do arbítrio, do mandonismo e do autoritarismo com impunidade. Os coronéis, com esses instrumentos, dominavam, mantinham e exerciam o poder e imobilizavam as forças sociais. Enquanto os coletores de impostos eram instrumentalizados para as funções de agentes arrecadadores, os delegados comandavam o sistema policial que incluía subdelegados e inspetores de quarteirão, numa rede capilar que atingia até os pequenos aglomerados. Esse sistema foi bem estudado por Vitor Nunes Leal no seu clássico livro Coronelismo, Enxada e Voto.

Na minha plataforma de campanha, prometi acabar – e, governador, acabei – com esse anacronismo perverso: o coletor não seria nunca mais indicação política e, sim, funcionário público qualificado e nomeado segundo critério técnico. Os delegados seriam escolhidos por concurso e as figuras dos subdelegados e inspetores de quarteirão foram extintas. O símbolo desse vergonhoso sistema, que não medi esforços para desmontar, eram os famigerados “troncos”, ainda existentes em alguns municípios do interior. Os “troncos” eram correntes de ferro cravadas em pesados troncos de árvores ou esteios, onde se acorrentavam os presos. Tratava-se de uma reminiscência dos tempos coloniais e da escravidão, que perdurava no Maranhão em pleno ano de 1966. Eleito, mostrei na televisão aquelas correntes, macabra imagem daquilo que estávamos erradicando. Muitos dos que ainda falam que o Maranhão não mudou em nada eram responsáveis ou cúmplices desse sistema.

A sociedade ansiava por liberdade e desenvolvimento. Administrar, no Maranhão, ainda era uma atividade artesanal, resumida a tarefas e insignificantes. Assumindo o governo, a primeira medida que adotei foi a de criar instrumentos legais, técnicos e administrativos que nos permitissem o ingresso na era do planejamento.

Nessa tarefa de ganhar os espíritos para as novas ideias, reuni técnicos, especialistas em diferentes matérias. A essa equipe excepcional de colaboradores atribuo os méritos pelo tanto que se conseguiu em tão pouco tempo. Tive apenas o privilégio de liderá-los. As linguagens novas que introduzimos ao abordar os problemas do Estado contribuíram para consolidar a consciência cívica para uma gradual mudança de mentalidade.

Foi o que o denominamos de “Maranhão Novo”, talvez a coisa mais importante de nossa História moderna. Busquei a renovação, recrutei só gente nova, que tinha de 27 a 30 anos. A eles dei oportunidade e confiança. Infelizmente alguns deles, que me combatem hoje, não aproveitaram, pensaram somente em conquistar poder e vantagens.

Mas a obra que iniciei e prossegui aí está. O Maranhão passou a ter espaço nacional. Fizemos ministros, ocupamos posições federais, chegamos mesmo a ter um presidente da República. Participamos da História do Brasil.

Foi a geração dos poetas, que me coube liderar, e que só o dogma fanático das ideologias pode pensar em apagar da História.

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As marcas do fanatismo

Da Coluna do Sarney

Três coisas na história da humanidade têm sido fonte das maiores atrocidades cometidas pelo homem: a religião, a raça e a ideologia. A primeira, que começa no dogmatismo, passa rapidamente para o ódio e descamba para a atrocidade. Há pior lembrança na história do homem do que a Inquisição? A fogueira queimando vivas as pessoas que eram consideradas infiéis. A arma dela era a delação. Os inimigos construíam mentiras, inventavam calúnias, fatos inexistentes que serviam de motivo para os famosos tribunais inquisitoriais que levaram tantos inocentes ao sofrimento da fogueira. Dos tempos antigos à perseguição aos cristãos levados a serem devorados pelas feras no Coliseu e Nero comandando o espetáculo. Quantos santos e mártires não estão inscritos nessa mancha simplesmente por acreditarem na vinda do Messias e na recusa de adorar os deuses pagãos.

sarney_roseanaVeja-se do que o fanatismo religioso é capaz nas imagens indignas da destruição no Museu de Mossul, das estátuas babilônicas, de milhares de anos antes de Cristo, que guardavam não só a arte, mas, através dela, os costumes e a evolução da humanidade. Já antes o que fizeram com o Museu de Bagdá, de onde levaram a mais antiga relíquia da história da escrita, que era a Pedra em que ficaram registrados os primeiros sinais em que o homem pensou em transferir a memória para símbolos – hoje as letras, ideogramas e escritas de toda forma.

O segundo, a perseguição e discriminação de raça, cujo exemplo maior é o holocausto que levou à câmara de gás e fornos crematórios milhões de judeus pelo ódio demente de Hitler na busca da raça ariana pura. A escravidão dos negros considerados como se não fossem humanos e sim coisas que podiam ser vendidas, trocadas, mortas, assim foram vítimas dos maiores sofrimentos de uma raça.

A terceira e mais sofisticada: as ideologias. Estas foram tantas e tão diversificadas que foram as que mais se propagaram e foram transformadas em costumes que serviam a motivações de todo tipo, englobando raça, religião e crenças pessoais – e até simulacro de boas ideias – quando, no fundo, o que prevalecia era quase sempre o interesse individual. Vejam-se os bilhões de pessoas mortas pelo stalinismo, sob a visão de uma sociedade sem classes. O nazifascismo, com outras motivações. O Gulag é um símbolo desse tipo de atrocidade.

Há uma palavra que parece não ser tão forte, mas que define toda essa violência sofrida pelo homem por diversos motivos: INJUSTIÇA.

O Maranhão não fugiu a nenhuma dessas misérias. A Inquisição por aqui passou e li há algum tempo um excelente trabalho de pesquisa feito por uma historiadora na nossa universidade federal, que infelizmente não guardei. Quanto à raça temos a marca do crime da Baronesa de Grajaú, e o relato do que foi o cativeiro na obra monumental de Josué Montello, Os tambores de São Luís, e as ideologias, estas, são constantes e agora renascem, depois de mortas, na perseguição vergonhosa que se derrama em todos os níveis.

Derrubam-se em Mossul as estátuas do passado sem adotar nenhuma proporção, mas aqui destrói-se a Fundação da Memória Republicana Brasileira. Agora, na pior de todas, inclui-se Roseana na investigação de um escândalo que envergonha o Brasil. E nesse gesto está a política do Maranhão. A instituição sagrada do Ministério Público, a qual meu pai pertenceu e eu fui um dos maiores beneméritos, prestigiando-a toda a vida – fui eu, como governador do Maranhão, o primeiro no Brasil a igualar o MP à magistratura; e sua atual organização foi feita pelo ministro (Sepúlveda) Pertence, durante meu governo e na Constituinte -, está sendo colocada agora mais a serviço do personalismo político do que do partidarismo.

Um cabeça coroada do órgão, cérebro e braço direito do dr. Janot, foi recusado para o CNMP pelo Senado. Agora, o dr. Janot, em solidariedade ao colega, coloca mal a instituição MP. Como vem fazendo desde a última eleição, quando pediu intervenção federal no Maranhão e perseguiu a governadora Roseana Sarney no episódio de Pedrinhas, resolve vingar-se de mim, atribuindo-me a culpa pela recusa do amigo. Eu não votei, não presidi a sessão que recusou seu nome, e nem sabia da votação. Agora, o dr. Janot, na sua escolha da lista dos destinados autos de fé, inclui Roseana nessa cloaca. Ela nunca foi à Petrobras, nunca teve nenhuma relação com o senhor Paulo Roberto, nunca teve nenhum pleito na Petrobras por firmas ou pessoas.

Da Petrobras, só pediu, não pedindo, mas – como dizia o padre Vieira – exigindo e protestando, a Refinaria de Bacabeira a que o Maranhão tem direito.

Assim, é justo o nosso direito de revolta pela INJUSTIÇA. Minha, porque jamais – não é do meu feitio – seria capaz de recusar o dr. Nicolao Dino por motivos pessoais, que não tinha e não tenho, cujas referências de bom profissional sempre ouvi; e de Roseana, que está amargando o fel da vingança, uma mistura de ódio e política.

Quais as acusações? O senhor Paulo Roberto teria dito que Lobão pediu a ele para ajudar Roseana na eleição. Youssef diz que não confirma nenhum pagamento a Roseana.

E o que fala o dr. Janot (ele?): “Apesar das divergências entre as versões de Costa e de Youssef, o Ministério Público Federal considerou que havia elementos suficientes para a abertura de inquérito contra Roseana”. Quais esses elementos? Não disse nem tem. Evidentemente, o dr. Janot fez uma escolha e usou a instituição Ministério Público para sua atuação, nessa escolha de a quem denuncia ou não, atarefado com sua própria eleição nestes dias.

Essa a verdade.