COLUNA DO SARNEY: Jerônimo de Viveiros – 50 anos de sua morte

Por José Sarney

Nos anos 50 eu frequentava com assiduidade a Biblioteca Pública do Estado, ainda localizada na Rua da Paz, onde hoje é a sede da Academia Maranhense de Letras. Lá encontrava sempre um velho de óculos debruçado sobre jornais velhos, com uma tira de papel almaço dobrada ao meio, fazendo, nessas tripinhas tão ao gosto da moda, anotações. Nascimento Morais, com quem trabalhei em O Imparcial – onde ele assinava uma coluna com o pseudônimo de Braz Sereno -, usava o mesmo método.

Estabeleci uma relação de aluno com o professor Viveiros, que passava dias inteiros naquela labuta da pesquisa. Escrevia àquele tempo Alcântara, no seu passado econômico, social e político, livro clássico sobre a velha cidade, que tinha a marca de sua família, célebre na política do Maranhão e que ali residira no passado. Seu bisavô foi senador do Império e seu avô, o Barão de São Bento, deputado provincial e chefe do Partido Conservador, dividindo com o dr. Carlos Ribeiro, Barão de Grajaú, presidente do partido, os dois mais importantes cargos políticos do Estado.

Jerônimo de Viveiros voltava ao Maranhão depois de sofrer uma brutal injustiça: fora demitido do cargo de professor estadual pelo interventor Paulo Ramos e também demitido do cargo de professor municipal pelo prefeito de São Luís, Pedro Neiva de Santana. Sem ambiente no Estado e perseguido, fora para o Rio de Janeiro e lá tinha sido admitido nada mais nada menos que no maior e mais tradicional colégio brasileiro, a menina dos olhos do Imperador, o Pedro II. Aposentado pela compulsória, retornara ao Maranhão e aqui dedicava seus dias a um trabalho constante e diuturno de nossa História. No Rio já escrevera as biografias de Celso Magalhães e de Gonçalves Dias.

Produz um livro que guarda a lembrança da vida cotidiana, Quadros da Vida Maranhense, com informações valiosíssimas, e se dedica a escrever uma das maiores obras já escritas em nossa terra: a História do Comércio do Maranhão, repositório de dados, subsídios, análises, da economia, das finanças, da vida e da história das grandes firmas e dos comerciantes do Maranhão. É um monumento. Ele não se preocupou – como diz Capistrano a respeito de João Lisboa – em escrever buscando um estilo literário e em fazer uma obra de literatura econômica. Fez um trabalho de pesquisa sobre a vida comercial, as instituições criadas pelas classes empresariais, responsáveis por pensar a economia maranhense. Levantou minunciosamente a atividade da Associação Comercial do Maranhão, a ação das classes produtoras sobre o Estado.

Ao escrever esse tratado, escreveu também a História da vida e da política no Império e na Colônia, tornando-se, assim, não um estudioso de uma face do Maranhão, o comércio, mas do seu corpo inteiro.

Convivi muito com o professor Viveiros. Muitas tardes ia para sua casa e lá, no meu canto, fazia-lhe companhia e presenciava o seu labor, debruçado sobre as folhas de papel. Sem dúvida alguma perdemos um tesouro ao não termos o cuidado de guardar seus originais.

Naquelas tardes estavam sempre dona Luiza e sua única filha. Tenho ainda hoje, em minha casa, um oratório que ele repetia que, por sua morte, queria que fosse uma lembrança para mim. Eu tinha uma verdadeira veneração por ele, um carinho e um afeto que guardo dentro do meu sacrário sentimental.

Mestre Viveiros, 50 anos de sua morte e na minha lembrança ainda está vivo, na dignidade do seu saber e de sua excepcional dedicação às letras e à História.

2 pensou em “COLUNA DO SARNEY: Jerônimo de Viveiros – 50 anos de sua morte

Os comentários estão fechados.