Não sei por que me deu vontade de escrever sobre a difícil arte dos besouros. Todos dizem que eles não podem voar, mas voam. Suas asas são pequenas, seu corpo é pesado e, pela gravidade, lei que vem da criação do universo, eles não deveriam voar. Daí, me fazem pensar nos políticos que também voam, muitos sem asas, rompendo a lei da gravidade e mais gordos e pesados que os besouros. Busco saber como eles são e me perco entre o latim e as espécies. É o besourinho de praia, que vive nas areias e que ataca os banhistas, quer deitados ou sentados. É o dos fumos, que ataca as folhas do tabaco e destrói e acarreta grandes prejuízos às indústrias que fazem a delícia dos fumantes. É o besouro-verdadeiro, da família dos coleópteros, lamelicórneos, destruidores de lavouras. Como é bom misturar latim e besouro, políticos e boticários, insetos e artigos de jornal.
Conheci um velho, na Ponta da Ilha, fazenda do meu sogro, que falava dos insetos como se falasse dos filhos. Conhecia-lhes os nomes, os apelidos e suas artimanhas. “O besouro-de-lima”, dizia, “tem a cor verde, passa para o roxo, o amarelo, muda e volta à cor, come folha de goiaba e faz o que quer e o que não quer”. Ele conhecia um besouro grande que dava nas palmeiras, roncava de noite, dormia de dia e também tinha as artes de botar mau-olhado e suspender as regras de moça menstruada, quando o esmagava nos pés. Meu avô fazia rapé de besouro de coco-babaçu e a ele atribuía efeitos rejuvenescedores.
Jorge Luis Borges escreveu um livro sobre a zoologia fantástica. Ele falou da “rêmora”, à qual se atribuía a faculdade de parar os barcos. Ali ele fala do lobo-cachorro, descrito pelo médico Ctesias, que partia tudo, pedras e raios e em seguida os digeria. Dizia ele que Plínio, no século I, deu a esse animal o nome de “crocota”. Era assim, como os políticos que engolem sapos, ou melhor, os bons políticos que sabendo que têm de engolir sapos, possuem uma coleção de rãs em casa e toda manhã comem uma, para habituar a garganta.
Mas começamos a falar dos besouros e estamos nos crocotas e nos sapos. Os besouros saem para voar contra as leis da natureza. Os políticos voam para cumprir as leis da natureza. Eles fazem acrobacias fantásticas, esforços extraordinários para se sustentar parados no ar e suas asas batem violentas e provocam sons que parecem sopros. Tudo artes da sobrevivência. O padre Vieira fez um sermão sobre os peixes. O peixe-voador, o peixe-pedra, o peixe-de-quatro-olhos, tudo pensando em falar sobre os mandões do seu tempo.
Usou os peixes para falar dos homens. Mas não falou do robalo. Há um besouro-robalo? Não sei. Mas os besouros que batem as asas na política hoje são muitos e de muitas espécies. Eles podem devorar as folhas da democracia e destruir as plantações.
De que família eles são? Do besouro tenebrium, o que dá em tempo de eleições.