A nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos – LLCA (Lei n.º 14.133, sancionada no dia 1º de abril de 2021, acompanhando a tendência do direito contemporâneo, trouxe capítulo específico sobre meios alternativos de resolução de controvérsias (Capítulo XII), prevendo, expressamente em seu art. 151, a possibilidade de utilização, dentre outros, dos comitês de resolução de disputas.
Conhecidos na língua inglesa como “Dispute Boards”, trata-se de um método extrajudicial de solução de conflitos consistente na formação de um conselho formado por profissionais especializados em uma matéria técnica e nomeados pelas partes de um contrato para acompanhar a sua execução e promover a resolução de eventuais controvérsias dali decorrentes.
Sua origem remonta à década de 70, mais especificamente na construção do Túnel Eisenhower, no Colorado, Estados Unidos. Surgiu como uma ferramenta de administração contratual de obras de infraestrutura e grandes construções, que possuem um longo período de duração e alta complexidade, e, por consequência, maior número de conflitos. Tornou-se também uma alternativa para evitar o contencioso judicial, que, já naquela época, era bastante oneroso, pelo seu alto custo e elevado tempo de duração, além de causar insegurança nos jurisdicionados ante a falta de especialização por parte dos julgadores na matéria tratada.
A utilização desse instrumento no Brasil, principalmente em instrumentos firmados pela Administração Pública, ainda está em fase de consolidação, o que pode ser causado pela insuficiência de normas sobre o tema. O Município de São Paulo, adiantando-se no assunto, editou a Lei Municipal n.º 16.873, de 22.02.2018 e, não por acaso, foi pioneiro neste país ao adotar o Dispute Board na PPP para a construção da Linha 4 (amarela) do Metrô de SP.
Em âmbito federal, a matéria já estava sendo tratada no Senado (Projeto de Lei n.º 206/2018) e na Câmara dos Deputados (Projeto de Lei n.º 9.883/2018), porém apenas com a sanção da LLCA é que se reconheceu, pela primeira vez, a legalidade da utilização desse instituto nos contratos administrativos.
Embora seja uma ferramenta alternativa à judicialização, as decisões do “Dispute Board” não fazem coisa julgada material, até mesmo porque não se trata de uma jurisdição, como é o caso da arbitragem (art. 3º, §1º do Código de Processo Civil). Desse modo, suas decisões, que podem ser apenas recomendações (Dispute Review Boards) ou vinculativas (Dispute Adjutication Boards), estão sujeitas ao controle judicial ou arbitral.
Não obstante isso, os números comprovam que se trata de um instituto eficaz na desjudicialização dos conflitos. Segundo dados do Dispute Resolution Board Foundation, o número de recomendações e decisões proferidas pelos comitês, em até 98% dos casos, sequer são desafiados pela via judicial ou arbitral.
E isso se dá, não há dúvidas, em razão da qualificação dos membros que compõem os comitês, porquanto são, costumeiramente, profissionais de notória especialização e altamente gabaritados em seus respectivos ramos de atuação e que têm a incumbência de proferir soluções rápidas e objetivas, solucionar problemas extremamente complexos de forma prática e funcional. Por essa razão, suas decisões são conhecidas na língua inglesa como “rough justice”, que significa justiça áspera.
Ainda que áspera, tendem a ser melhores e muito mais adequadas que as decisões da jurisdição ordinária, uma vez que as informações levadas pelas partes são analisadas e verificadas de forma imediata e in loco, porquanto os membros do board devem estar presentes de forma rotineira no canteiro de obras, podendo estar engajados desde o início do projeto.
Dito isso, recebo com alvíssaras a incorporação dos dispute boards na Lei de Licitações e Contratos Administrativos, uma vez que, além de contribuir no descongestionamento de processos no Poder Judiciário, trata-se de uma ferramenta que, se bem utilizada, certamente trará desenvolvimento para o país e permitirá uma atuação da Administração Pública de forma mais eficiente.
* Texto escrito em 09.04.2021.
Tarcísio Almeida Araújo
Advogado, Procurador-Geral da Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão, Mestrando em Direito pelo IDP-Brasília.
Não é só esse o meio ágil e alternativo a qual a nova lei — de bom grado e com muitos aplausos dos meios licitatórios — traz para a prevenção e resolução de controvérsias sempre presentes nas contratações públicas. Notadamente, as escusáveis de práxis por parte de maus e incompetentes gestores públicos como o constitucional Restabelecimento de Equilíbrio Econômico-Financeiro dos Contratos; reiterados Inadimplementos de Obrigações Contratuais e Cálculos de Indenizações que poderão agora ser tratadas por meio do consagrado instituto da Arbitragem (art.152), que é uma espécie de juizado particular. Evitando-se, desse modo, os longos contenciosos judiciais que em via de regra atrasam e só prejudicam os particulares.
Cumpre dizer que os contratos praticados atualmente no Governo do Estado e em muitas administrações maranhenses, ignoram completamente o consagrado instituto da Arbitragem (Lei 9.307/96 e Lei 13.129/15) em que pese diversos apelos de entidades independentes que representam os administrados, bem como da auspiciosa CBMAE/MA.