Aliados do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), avaliam, sem alarde, alternativas para substituir o orçamento secreto, artifício criticado pelo petista durante a campanha e por meio do qual parlamentares indicam verbas da União sem serem identificados e de forma desigual. Eles já receberam sinais de que a atual cúpula do Congresso está disposta a negociar mudanças.
Por ora, o grupo de Lula pretende levar eventuais conversas em marcha lenta. O futuro governo aposta na possibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) decretar a ilegalidade do instrumento. Isso pouparia o presidente eleito dos desgastes de uma negociação com o Congresso para pôr fim ao expediente que empoderou deputados e senadores.
O orçamento secreto previsto para 2023 é de R$ 19,4 bilhões. Hoje, a partilha desses recursos é capitaneada pelos caciques do Centrão, principalmente o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), aliado do presidente Jair Bolsonaro (PL).
— Temos um presidente eleito que se coloca frontalmente contra as emendas de relator. O STF sinalizou que irá julgar. Então, temos uma situação delicada. Ainda não recebi nenhum emissário do governo eleito para propor alternativas. Estamos analisando possíveis alternativas, mas não temos nada fechado. Se o Supremo desse a decisão, seria um favor muito grande a Lula — resume o relator do Orçamento, senador Marcelo Castro (MDB-PI).
Enquanto o Judiciário não bate seu martelo, líderes estudam alternativas para compensar o eventual enxugamento das emendas de relator. Uma delas seria aumentar o valor das emendas individuais. Hoje, cada deputado e senador tem direito a destinar R$ 19,7 milhões do governo federal para a área que escolher. Metade desse montante, porém, deve ser indicado para saúde e educação. Ao contrário do orçamento secreto, as emendas individuais são distribuídas igualmente entre todos os deputados e senadores, independente de ser da base aliada ou da oposição, e de ter trânsito ou não com a cúpula do Congresso.
Outra proposta seria manter o valor robusto das emendas de relator, que compõem o orçamento secreto, mas fixar critérios que, de fato, permitam a transparência dos repasses. Nesse caso, porém, se somente essa medida for tomada, a distribuição dos recursos continuaria desigual. Desde o início da campanha, Lula diz que acabará com o mecanismo, que usou como um dos exemplos de suposta corrupção no governo Bolsonaro.
— Há alternativas, mas o que não pode é perdermos a prerrogativa de termos ao menos 1% do orçamento — diz o líder do União Brasil, Elmar Nascimento (BA), que é aliado do presidente da Câmara.
O grupo de Arthur Lira já sinalizou que aceita “ajustar” as emendas que compõem o orçamento secreto. Isso significa que os R$ 16 bilhões reservados para 2022 poderiam diminuir no ano que vem ou serem incorporados às verbas ministeriais, por exemplo.
Deputados de PP, PL e Republicanos — partidos que formam o núcleo duro do Centrão —, próximos a Lira exigem, no entanto, que o Legislativo mantenha o controle sobre quanto cada parlamentar deverá receber, ainda que o recurso engrosse os caixas dos ministérios. Esse grupo rechaça a ideia de que a distribuição dessas verbas “extras” volte às mãos do Executivo, como era feito no início do governo Bolsonaro e também nas gestões petistas e de Michel Temer.
Em uma sinalização ao governo eleito e ao STF, Lira se dispôs a dialogar sobre alterações nas regras do mecanismo. Isso não significa, porém, que a intenção seja diminuir o controle de recursos pelos parlamentares. Durante a semana, o deputado ficou de conversar com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sobre quais mudanças seriam factíveis. O debate, porém, acabou ficando para depois.