Para procurador da República, ex-prefeita de Bom jardim e seu grupo criminoso ainda têm poder e influência para atrapalhar instrução criminal
De O Estado
(Foto: De Jesus/O Estado)
O procurador da República Galtiênio da Cruz Paulino pediu à Justiça Federal no Maranhão a reconsideração da decisão do juiz federal Magno Linhares, da 2ª Vara da Justiça Federal, que revogou a prisão preventiva da ex-prefeita de Bom Jardim, Lidiane Leite, e a substituiu por medidas cautelares.
Ela é acusada pela Polícia Federal de, junto com o ex-marido, Beto Rocha, e o ex-secretário de Agricultura, Antonio Cesarino, comandar um esquema de desvios de recursos que consumiu pelo menos R$ 15 milhões de recursos destinados à merenda escolar e à reforma de escolas no Município.
Na ação, a que O Estado teve acesso com exclusividade, o representante do Ministério Público Federal (MPF) contesta os três principais pontos da decisão judicial que determinou a liberdade da ex-gestora: o fato de que, em tese, ela não pode mais atrapalhar a instrução processual por não ser mais prefeita; a alegada espontaneidade da apresentação da acusada; e a falta de denúncia mesmo após a conclusão do inquérito.
Para Galtiênio Paulino, o poder da ex-prefeita não decorria apenas do cargo que ela ocupava, mas da ascendência política do grupo ao qual ela pertence em Bom Jardim e, principalmente, da sua ligação com o ex-marido, Beto Rocha – este também preso na Operação Éden, desencadeada pela Polícia Federal em agosto deste ano.
“Possui a recorrida, […] junto com o seu grupo criminoso, uma forte influência política no Município de Bom Jardim, tendo ainda grande capacidade de coagir testemunhas”, destacou o procurador, lembrando que muitos dos colaboradores das investigações são pessoas “extremamente humildades”, muitas temerosas em virtude das ameaças sofridas ao longo da apuração.
“A influência e a coação que a recorrida exercia sobre as testemunhas se dava não em razão do cargo de prefeita que exercia, mas em decorrência do poderio econômico e político que tem no local, independente de qualquer cargo, o que a leva a constranger pessoas humildes a serem coniventes com seu esquema criminoso”, argumentou.
De acordo com Paulino, o risco à instrução criminal permanece atual. “A atualidade do risco à instrução criminal e à ordem pública, resultante da soltura da recorrida, consiste no fato de que a capacidade intimidatória não deixou de existir, uma vez que livre a recorrida poderá facilmente procurar as pessoas por ela arregimentadas no esquema e ameaçá-las/intimidá-las para que não prestem depoimentos”, completou.
Apresentação
O MPF contesta também o argumento do juiz Magno Linhares segundo o qual Lidiane Leite se apresentara espontaneamente após a decretação da sua prisão. No recurso, Galtiênio Paulino lembra que ela passou 39 dias foragida e que se entregou à PF apenas após ter garantias do que classificou de “tratamento privilegiado” – que é como ele se refere à concessão da prisão em cela especial no quartel do Corpo de Bombeiros.
“Como considerar espontânea a apresentação de uma pessoa que ficou 39 dias foragida e que só se apresentou em decorrência de saber que não seria de fato presa, mas premiada com um privilégio indevido (que não tinha direito)?”, questionou.
MAIS
No seu pedido, o MPF contesta, ainda, o argumento de que não teria ofertado denúncia mesmo com inquérito policial já relatado. “De fato, o IPL [inquérito] foi relatado no dia 17/09/2015. Porém, até o momento, o Ministério Público Federal não recebeu os autos, o que o impossibilita de oferecer denúncia”, afirma o procurador.
Sensação de impunidade
Ao pedir que a Justiça Federal decrete nova prisão preventiva da ex-prefeita de Bom Jardim, Lidiane Leite, o procurador da República Galtiênio da Cruz Paulino argumenta que sua liberdade pode favorecer o aumento da sensação de impunidade e de descrença na Justiça.
Para ele, o fato de a acusada ter “posição de evidência na sociedade” pode, ainda, levar à impressão de que “o descaso com a coisa pública é correto e não traz nenhum prejuízo”.
“Ou pior, faz aflorar aquela sensação de impunidade que se traduz na seguinte frase: ‘a justiça só se aplica aos pobres’. Corre-se o risco de se enraizar na sociedade um sentimento de impotência do direito penal e das instituições que o aplicam, reforçando o adágio popular de que ‘o crime compensa’”, relata.
Segundo o representante do MPF, essas seriam “danosas consequências” à sociedade.
“A fim de evitar qualquer das danosas consequências descritas acima é que se fundamenta a necessidade de restabelecimento da prisão preventiva”, conclui.